O agravamento da crise climática representa um grande risco para a vida em todo o planeta, mas a perda de ecossistemas ricos em biodiversidade como a Amazônia podem ser ainda mais graves para o mundo. Diante da expectativa pela COP30, que acontece em Belém, em novembro, o cientista e climatologista Carlos Nobre vê na conferência um momento histórico para convocar a humanidade para agir pela proteção da floresta e das populações locais e evitar um colapso com consequências graves.
“A COP30 será a primeira reunião da UNFCCC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima) realizada na Amazônia e representa uma oportunidade crucial — e possivelmente a última — para debater e encaminhar soluções capazes de proteger todos os biomas do planeta, especialmente evitar que a floresta amazônica ultrapasse limites do ponto de não retorno”, defende o cientista, em artigo para o Ecoa.
A Amazônia, que sofreu nas últimas cinco décadas com algumas das maiores taxas de desmatamento e degradação de florestas tropicais, é uma das mais ameaçadas pelas mudanças climáticas. Nobre chama atenção para os chamados tipping points ou pontos de não retorno, ponto onde os danos à floresta são tão grandes que ela não consegue mais se recuperar sozinha. Nesse estágio, a degradação avança de forma acelerada.
“Ou avançamos em soluções reais — integrando ciência, tecnologia, saberes locais e vontade política — ou testemunharemos o ponto de não retorno da maior reserva biológica e fornecedora de chuvas da superfície terrestre”, escreve Nobre
Para evitar as piores previsões, a solução é zerar o desmatamento, a degradação e os incêndios florestais. Isso porque se os cerca de 20% de floresta desmatada forem combinados com aumentos de temperatura na casa de 2ºC a 2,5ºC, ou seja, acima dos limites do Acordo de Paris, o ponto de não retorno seria inevitável. De acordo com as projeções, até 70% da paisagem seria alterada e a floresta amazônica ficaria restrita às regiões oeste e noroeste, próximo à Cordilheira dos Andes.
“Se esses limites forem ultrapassados, haverá impactos severos no regime de chuvas, na produtividade agrícola e florestal, nas emissões globais de gases de efeito estufa e na diversidade biológica e cultural. Isso agravaria as desigualdades na Amazônia, impondo um ciclo vicioso de degradação ambiental e injustiça social difícil de ser superado”, alerta o pesquisador.
Para evitar essa situação, Carlos Nobre defende também a necessidade de estratégias relacionadas à restauração florestal, às estratégias de inovação e à bioindustrialização como caminhos para o desenvolvimento sustentável. Outras alternativas são a aposta na contribuição dos povos indígenas e a produção de energia renovável como soluções baseadas na natureza.
A ocupação indígena da Amazônia, que data de mais de mais de 12 mil anos, foi responsável por manejar a biodiversidade e fazer com que espécies nativas fossem consumidas e espalhadas pelo território. Hoje, a mandioca, o urucum, a castanha-do-pará, o cacau, a andiroba, o açaí e outras são patenteadas e consumidas em diversas partes do mundo. Assim como elas, cerca de 2.300 espécies nativas são conhecidas pelos indígenas e cientistas e naturalistas e podem ser exploradas em indústrias de cosméticos, alimentos, fármacos e biotecnologia.
Outra estratégia promissora é a produção de energia renovável a partir de resíduos da biodiversidade amazônica. Estudos apontam que a biomassa gerada pelo processamento de frutos como o açaí e a castanha-do-pará pode ser reaproveitada para produção de energia térmica com capacidade de abastecer as cerca de 200 mil residências da Amazônia que ainda estão fora da rede elétrica convencional.
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