O agro pode levar o Brasil a zerar as emissões de gases de efeito estufa (GEE) até 2040 — dez anos antes de sua meta oficial de 2050. Para isso, é preciso acelerar a adoção de práticas já conhecidas pelo setor, alcançando o desmatamento zero e garantindo até 87% das remoções de carbono, etapa fundamental para a neutralidade climática.
Este caminho, chamado Afolu-2040 (sigla para Agricultura, Florestas e Uso da Terra), foi apontado no estudo Brazil Net-Zero by 2040, coordenado pelo Instituto Amazônia 4.0 e conduzido por pesquisadores como Carlos Nobre (USP) e Mercedes Bustamante (UnB), em parceria com outras cientistas de outras universidades.
Na prática, a proposta é dar escala à integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF), aos sistemas agroflorestais (SAFs), à agricultura regenerativa e à recuperação de pastagens degradadas. Todas essas estratégias devolvem fertilidade ao solo, reduzem a pressão sobre áreas nativas e aumentam o sequestro de carbono.
“Se bem-sucedido, o Brasil poderá se tornar um exemplo para o Sul Global, mostrando que crescimento econômico e ação climática ambiciosa podem caminhar juntos”, destaca a equipe.
Ao ampliar essas estratégias, o País poderia restaurar cerca de 18,2 milhões de hectares em 15 anos. Além disso, reduziria drasticamente o desmatamento até 2030 e alcançaria a neutralidade de dióxido de carbono (CO₂) até 2035, pavimentando o caminho para a neutralidade total de gases de efeito estufa.
“As emissões começariam a cair rapidamente já em meados da década de 2020. A partir de 2030, o país se aproximaria de um ponto de equilíbrio, quando a restauração e o reflorestamento passariam a remover mais carbono da atmosfera do que o emitido por mudanças no uso da terra”, mostra o estudo.
Baixo custo e alto potencial econômico
Além de tecnicamente possível, o Afolu-2040 se mostra economicamente viável. Segundo o estudo, antecipar em dez anos a neutralidade climática exigiria apenas 1% a mais de investimento em relação à meta atual, considerada modesta diante dos ganhos ambientais e sociais que o modelo proporciona.
A principal vantagem desse caminho é o baixo custo de transição, já que o Brasil conta com uma base consolidada de políticas e práticas sustentáveis. Outro ponto importante é que a transição tende a abrir novos mercados para o agro brasileiro, fortalecendo cadeias produtivas que conciliam conservação e rentabilidade.
“Nós vamos precisar fazer ajustes e quanto mais cedo a gente começar a fazer esses ajustes, mais fácil e menos custoso será. Quanto mais a gente postergar essas decisões, que são de transformação grande da matriz econômica brasileira, mais caro e mais difícil vai ser”, disse Maria Bustamante à Agência Brasil.
Transição energética
Um segundo cenário foi analisado no estudo: o Energy-2040, que aposta na transformação da matriz energética brasileira. O modelo prevê uma redução drástica do uso de combustíveis fósseis, com queda de 55% no consumo de petróleo até 2035, redução de 41% na produção das refinarias e diminuição de 71% nas exportações.
Neste caso, a neutralidade em 2040 seria alcançada com eletrificação dos transportes, e a substituição de combustíveis industriais, por exemplo. Apesar do potencial, esse caminho exigiria cerca de 20% a mais de investimentos do que o cenário atual, em razão da necessidade de novas infraestruturas e inovação tecnológica.
Segundo Mercedes Bustamante, essa transição energética deve ocorrer de forma integrada ao uso sustentável da terra, aproveitando o potencial do setor agropecuário para compensar as emissões remanescentes.
“Na parte do reflorestamento, seriam metas mais ambiciosas de restauração e, na parte da agricultura, sua transformação em um modelo mais próximo da agricultura regenerativa. Esse ganho que nós teríamos com sequestro de carbono pelas atividades de uso da terra nos permitiria fazer uma transição energética mais gradual”, conclui.
Fonte: André Garcia/ Gigante 163


