Esqueça o que você sabe sobre o calendário. No coração da Amazônia, 2025 não foi um ano de transição, mas sim de convergência. O Pará se firmou como palco de uma revolução silenciosa, onde a sabedoria ancestral, a urgência climática e o compromisso com a sustentabilidade se encontraram.
Produtores e empreendedores paraenses colocaram o estado no mapa mundial da inovação verde, com a COP30. Mas antes da conferência do clima e depois dela, o ano foi marcado por personagens que transformaram desafios em soluções de bioeconomia.
Relembre algumas dessas pessoas que foram destaque no Pará Terra Boa em 2025.
Vinho com sabor de floresta
Sâmia Lirne está no centro da revolução silenciosa que transforma frutos amazônicos em vinhos artesanais com compromisso de sustentabilidade. A Alter do Chão Wine, de Santarém, com menos de um ano, já se destaca: além de produzir vinho de açaí com 20% do caroço incluído na fermentação, a empresa tem na sustentabilidade o guia de todas as suas práticas, desde o modelo de coleta sustentável com comunidades locais até o cuidado com o solo e as gerações futuras.

Chocolate fino, amigo da natureza
No município de Brasil Novo, na região do Xingu, agricultores familiares estão liderando a transformação do cacau em chocolate fino, consolidando a bioeconomia local. O movimento de verticalização da produção tem como uma de suas pioneiras Jiovana Lunelli, da Cacau Xingu, cuja fábrica em sistemas agroflorestais foi a primeira do estado a obter o registro artesanal. Mas Iradi Frutuoso (Frutuoso Chocolate) e Verônica Preuss (“Kakao Blumenn”), entre outros, têm ajudado Brasil Novo a se consolidar como uma das principais referências da cacauicultura no Pará.

Palafita sustentável
O engenheiro civil José Coelho transformou as memórias de sua infância na ilha de Santa Rita, em Juruti, marcada pelas dificuldades das cheias do Rio Amazonas, em uma solução inovadora: a Casa de Várzea. Seu projeto patenteado de palafita sustentável resolve o problema dos alagamentos comuns nas várzeas amazônicas. Isso se deve a um sistema de elevação hidráulica natural que permite que a casa acompanhe o movimento das cheias, evitando inundações. Além disso, a casa utiliza uma madeira biosintética durável (feita com 70% de resíduos vegetais, como caroço de açaí, e 30% de plástico reciclado) tratada com o princípio ativo da andiroba, que atua como repelente natural de insetos transmissores de doenças. O projeto é totalmente sustentável.

Frutos da floresta em pé
A produtora Hortência Osaqui é a responsável por transformar o bacuri no símbolo de um empreendimento familiar de sucesso e sustentabilidade na Fazenda Bacuri, em Augusto Corrêa. Após assumir o legado de mais de 50 anos deixado por seu pai, Henrique Osaqui – que na década de 1970 iniciou o manejo agroflorestal para recuperar uma área degradada de 64 hectares –, ela inovou ao verticalizar a cadeia produtiva em 2009. Sua visão resultou na criação de uma agroindústria com a marca Osaqui, que hoje produz geleias, compotas e licores artesanais de frutas amazônicas como bacuri (simples e com pimenta), açaí e cupuaçu, todos com certificação orgânica e autorização para exportação para a Europa e os Estados Unidos, com todos os insumos básicos (exceto o açúcar orgânico) produzidos na própria fazenda.

Borracha + açaí = tênis
O empreendedor social Francisco Samonek está reativando seringais nativos e transformando o látex em uma cadeia de valor sustentável, com a Seringô. A empresa fabrica tênis a partir de 70% de borracha amazônica e 30% de caroço de açaí, em um processo artesanal, limpo e sem geração de resíduos. A startup inova ao integrar a extração do látex à dinâmica da agricultura familiar no Marajó, com capacitação para que as mais de 1.500 famílias envolvidas no empreendimento tenham uma renda melhor e possam vender tanto a matéria-prima quanto artesanato e biojoias feitas com recursos da floresta. A Seringô desenvolve uma tecnologia social que valorize o seringueiro como um empreendedor, gerando renda e um pagamento pela proteção da floresta.

Mudança de mentalidade
O agricultor Antônio Maurício Batista, de Itupiranga, no sudeste paraense, representa uma importante mudança de mentalidade na Amazônia. Após anos desmatando a floresta para plantar capim para gado – prática predominante em sua região –,o produtor inverteu seu caminho ao aderir aos Sistemas Agroflorestais (SAFs). Ele descobriu que plantar espécies produtivas como cacau e açaí, que dão sustento à família, também contribui para o meio ambiente. Com isso, ele conseguiu não apenas diversificar sua produção e aumentar a renda, mas também recuperar uma área degradada em sua propriedade.

Um banco de sementes
Na comunidade quilombola São Sebastião Cipoal, em Portel, na região do Marajó, o professor e especialista em educação no campo Maicon Oliveira está na linha de frente do combate à crise climática. Como participante do projeto Juventude Pelo Clima do Ipam (Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia), ele criou um projeto que inclui a montagem de um banco de sementes, um “cofre” genético essencial para reflorestar áreas desmatadas ou com características desérticas no território quilombola. O banco não apenas garante acesso a sementes de qualidade, como também serve para preservar a ancestralidade e a saúde da comunidade, evitando a perda de espécies medicinais e garantindo alimentos para a escola local.



