O relatório-síntese da Convenção do Clima da ONU (UNFCCC) acendeu um dos principais alertas para a COP30: o mundo está atrasado em suas promessas climáticas. Apenas 64 dos 197 países-membros atualizaram suas metas de combate ao aquecimento global, um número ainda menor apresentou compromissos à altura da meta de 1,5°C do Acordo de Paris.
O documento foi divulgado, nesta terça-feira (28), com informações insuficientes. Entretanto, a frustração já era esperada, já que o prazo para entrega das chamadas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) foi sendo empurrado desde 2024. A diferença é que agora, com o relatório oficial e suas lacunas em mãos, a falta de avanços torna-se um obstáculo real para as negociações de Belém, que começam dentro de 13 dias.
As NDCs são o coração do esforço global, onde cada país registra suas metas de redução de emissões. O problema: os documentos entregues cobrem apenas 30% das emissões mundiais. Os outros 70% permanecem sem plano claro, o que impede qualquer projeção confiável sobre o futuro do clima.
“Não é possível tirar conclusões abrangentes a partir desse conjunto limitado de dados”, reconheceu a própria UNFCCC no documento.
Nesta rodada, a ONU pediu que os países declarassem metas para o período de 2030 a 2035. A ideia era medir se o ritmo de cortes é suficiente para manter viva a meta de Paris. O resultado, porém, foi considerado desanimador:
as novas NDCs indicam queda de apenas 17% nas emissões até 2035, quando o necessário seria 57%, segundo o IPCC, o painel científico da ONU.
“Segue evidente que uma grande aceleração é necessária para garantir reduções mais rápidas e profundas”, diz o texto da convenção.
Frustração anunciada
Embora o relatório não aponte culpados, os nomes ausentes indicam suspeitas. A China, maior emissor do planeta, ainda não oficializou sua meta, limitando-se a um anúncio informal. Já Índia e União Europeia, respectivamente, terceiro e quarto maiores emissores, também não entregaram. Entre os membros do G20, apenas sete nações submeteram novas NDCs.
“É frustrante. Parece um ciclo de atraso”, diz Natalie Unterstell, presidente do Instituto Talanoa. “Treze membros do G20 ficaram de fora. O mundo chega à COP sem um quadro claro da situação global. Estamos empurrando o problema com a barriga.”
Para tentar encorajar os países a entregarem suas NDCs, tanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) quanto o secretário-geral da ONU, António Guterres, fizeram diversos apelos ao longo dos últimos meses.
No entanto, nem mesmo adotar um tom mais rígido, quando Lula sugeriu punir quem não cumprisse suas obrigações climáticas durante a Assembleia-Geral da ONU, realizada em setembro, acabou surtindo efeito.
Parte da frustração do setor foi antecipada na última quarta-feira, 22, quando António Guterres afirmou que não será possível cumprir a meta de limitar o aquecimento global a 1,5°C.
“Ultrapassar o limite agora é inevitável”, disse Guterres.
A expectativa da ONU e do governo brasileiro era trazer um documento robusto, já que a COP de Belém marca dez anos do Acordo de Paris. No entanto, a falta de detalhes para compreender o estágio atual do planeta na trilha do aquecimento global acaba desacelerando também as negociações da COP30.
Em 2021, durante a COP de Glasgow, o atraso ocorreu, mas foi parcialmente relevado porque o mundo estava começando a sair do caos da pandemia de COVID-19, somado à construção do primeiro balanço global (Global Stocktake). Mas agora, o atraso é alvo de indignação.
“É muito pior ver isso de novo cinco anos depois”, alerta Stela Herschmann, do Observatório do Clima. “Precisamos de conversas francas sobre por que não estamos implementando o que foi decidido no Global Stocktake.”
Quais os avanços?
O documento revelou que 73% dos países agora incluem metas de adaptação em suas NDCs, algo essencial diante de impactos já inevitáveis. Parte deles, equivalente a três quartos, menciona uma “transição para longe dos combustíveis fósseis”, uma mudança central para conter o aquecimento.
Além disso, cresce o número de países que calculam o custo da ação climática e estimam o valor de US$ 1,9 trilhão por ano em investimentos necessários. Em paralelo, a discussão sobre financiamento climático e o fundo de US$ 1,3 trilhão anual para países em desenvolvimento.
Na próxima semana, cinco dias antes do início da COP30, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva recebe líderes globais em Belém para a Cúpula do Clima, nos dias 6 e 7 de novembro. A expectativa até lá é que China e União Europeia finalmente apresentem suas NDCs, o que daria novas esperanças às negociações.
“Esse retrato mais amplo, mesmo que ainda incompleto, mostra que as emissões globais vão cair cerca de 10% até 2035”, afirmou Simon Stiell, secretário-executivo da UNFCCC.
Desta forma, mesmo com um ‘boicote’ de parte das nações, a UNFCCC escolhe considerar com otimismo a ideia de que os esforços coletivos conseguiram interferir nas emissões, que agora caem pela primeira vez. Para Stiell, se essas metas forem cumpridas, a redução das emissões seria de 17%.


