Por Tereza Coelho
Aumentar a produtividade no campo, recuperar áreas degradadas e, ao mesmo tempo, evitar o desmatamento parece um desafio. No entanto, estudos de institutos de pesquisa e universidades mostram que é possível alcançar essas metas ao combinar tecnologia e conhecimento tradicional.
A a expansão da agropecuária na Amazônia cresceu 417% entre 1985 e 2023. Nesse período, a área ocupada pela combinação da criação de gado com o cultivo de soja, arroz, citrus e dendê, entre outras culturas agrícolas saltou de 12,7 milhões de hectares para 66 milhões de hectares.
Os dados do MapBiomas apontam que existem desafios para conciliar o aumento da produtividade no campo e a recuperação de áreas degradadas sem provocar novas destruições da floresta.
Cândido Oliveira Neto, agrônomo e professor da Universidade Federal Rural da Amazônia (UFRA), aponta que tudo começa com a investigação do solo, que funciona como uma avaliação médica para identificar possíveis deficiências e formas de melhoria.
“A gente tem que avaliar o solo para entender o nível de degradação, o que o degradou (porque há várias formas de degradação), assim como conhecer a área, o clima, a região, se está sujeita a alagamentos ou estiagens”, conta.
Melhores estratégias
Semelhante ao diagnóstico médico, essa etapa ajuda os profissionais a definirem as melhores estratégias, levando em consideração a realidade do solo e os objetivos para a área. Cândido conta que não existe um protocolo padrão ou “receita de bolo”, mas sim estratégias adequadas a cada realidade, clima e objetivo.
“O objetivo é fortalecer o solo, tanto para a recuperação de áreas degradadas quanto para melhorar o potencial produtivo. Tudo começa com a proteção e melhoria da área, seja pela quantidade de microrganismos ou pela estrutura física e química”, diz.
Para a recuperação do solo, o pesquisador enfatiza a importância de priorizar o uso de espécies sempre que houver a possibilidade. “Essas espécies já estão mais adaptadas a todos os fatores relacionados ao clima do local, como temperatura e umidade”, conta.
No geral, o trabalho inicia com o uso de gramíneas (plantas como gramas, capins e relvas, presentes em todos os continentes e principal alimento de suínos, bovinos e aves), leguminosas e demais espécies que auxiliam no processo inicial de regeneração.
Dependendo do potencial de alagamento da área, também é possível utilizar espécies como o Pau-de-balsa (Ochroma pyramidale) ou a Palheteira (Clitoria fairchildiana), também conhecida como Sombreiro ou Sombra-de-vaca. Além disso, há outras opções aplicáveis, como a Cupiúba (Goupia glabra Aublet) e o Cumaru (Dipteryx odorata).
Resultados duradouros
O pesquisador destaca que o trabalho é gradual, mas alcança resultados duradouros. “Muitas delas conseguem se desenvolver, fazem aquela cobertura principal para proteger o solo e, aos poucos, melhoram a quantidade de microrganismos, assim como a estrutura física e química. Daí você vai intercalando: gramíneas, espécies nativas, florestais, para ir aos poucos recuperando esse solo”.
Cândido explica que, embora a floresta pareça distante para alguns, a realidade da produção e as consequências do estresse climático estão mais próximas da população do que se imagina, já que dificuldades ou grandes volumes de perda de produção geram produtos mais caros e de pior qualidade na mesa do consumidor.
“A falta de água (pela redução ou descontrole das chuvas) e o aumento da temperatura (em períodos do ano fora do comum ou causados pelo desmatamento) induzem o crescimento de plantas daninhas e causam problemas na estrutura física do solo, provocando sua erosão, queda na qualidade nutricional, afetando a fisiologia da planta e diminuindo o processo de fotossíntese, que é o alimento necessário para que a planta tenha todos os seus aparatos fisiológicos, metabólicos e bioquímicos funcionando para ter um bom crescimento e produtividade. Ora, se essa planta não consegue ter esse crescimento ideal, essa produção de alimento ideal, a produtividade vai cair e, consequentemente, vai afetar as safras e a oferta em relação à demanda, gerando prejuízo e desemprego para quem vive da terra e alimentos mais caros na mesa de quem consome”, diz.
O caminho mais seguro para evitar a derrubada de floresta e cuidar das áreas degradadas sem perder a produtividade envolve a união de técnicas utilizadas por povos tradicionais e a tecnologia. O pesquisador cita que a junção das formas de conhecimento funciona como uma colaboração, em que o conhecimento ancestral dá os primeiros passos e aponta rotas possíveis para que o conhecimento técnico avance.
“Temos várias tecnologias à disposição, algumas mais conservacionistas e outras consideradas mais inovadoras, mesmo que já se utilizem há mais tempo, como o uso de drones para semear e visualizar as áreas onde há problemas, uso também de fertilizantes orgânicos, entre outros. As técnicas mais utilizadas (para aumentar a produtividade sem desmatar) são a rotação de cultura, o uso eficiente da água, o melhoramento genético, o uso associado de lavoura, pecuária e floresta (ILPF), o manejo integrado de pragas, entre outros”, destaca.
Para o pesquisador, é completamente possível aumentar a produtividade sem destruir o meio ambiente.
“Usar o conhecimento tradicional e associá-lo a uma implementação e introdução de novas tecnologias vão ajudar o pequeno e o grande produtor de forma mais eficiente e sustentável”, conclui.
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