Um histórico de multas por desmatamento e até por submeter trabalhadores a condições análogas à escravidão faz parte da trajetória de Roque Quagliato, pecuarista com um dos maiores rebanhos da região de Xinguara, no sudeste paraense. Conhecido como o “Rei do Gado”, Quagliato agora aposta na mudança de perfil da atividade que é a principal responsável pelo desmatamento e emissões de gases do efeito estufa na Amazônia. As informações são da Reuters, publicadas pelo Infomoney.
Em setembro do ano passado, o gado da família do pecuarista foi o primeiro a receber os brincos para rastreabilidade no projeto liderado pelo governo estadual. A meta do Pará é ter 100% do trânsito de bovinos rastreado individualmente até dezembro de 2025 e todo o rebanho até dezembro de 2026.
“O que a gente espera é que, no final de tudo isso aí, o mercado internacional dê ao Brasil um preço melhor”, disse Roque Quagliato.
O objetivo é entrar nos mercados dos Estados Unidos, Europa e Ásia e aumentar a lucratividade dos negócios. Os dados da Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (ABIEC) indicam que o valor médio da carne bovina vendida pelo Brasil é 8% menor do que o do Uruguai, que rastreia o gado individualmente. O país vizinho tem como seu principal cliente a União Europeia, que trabalha para livrar suas cadeias de suprimentos da ligação com o desmatamento.
A mudança é rentável, mas exige um custo elevado. Isso tem afastado alguns pecuaristas da proposta, mas, segundo Quagliato, quando se sentam para conversar sobre o assunto, os produtores concluem que “é o momento, tem que fazer agora”.
Até maio, somente cerca de 12 mil animais foram rastreados individualmente pelo sistema. Bem abaixo do total de mais de 26 milhões de cabeças de gado do estado. A resistência vem tanto de pequenos quanto grandes produtores, como é o caso de Lincoln Bueno, da exportadora de carne Mercúrio, que disse não rastrear seu gado por temer ser punido por possivelmente comprar de pequenos fornecedores que desmataram ilegalmente em suas áreas.
Já Alaion Lacerda fornece bezerros para engorda. Ele admite que todos os produtores da região têm passivos ambientais por causa dos pastos criados em áreas com floresta derrubada. Com a rastreabilidade obrigatória, o pecuarista acredita que não poderá mais vender os animais para outros produtores e nem frigoríficos.
Para reverter esse quadro, o programa do governo conta com parceiros de peso. O Bezos Earth Fund doou 16,3 milhões de dólares para a iniciativa; a JBS, maior produtora de carne do mundo, doou 300 mil brincos de identificação; e a adesão de produtores como Quagliato ajuda a abrir portas no setor.
Apesar de algumas deficiências do sistema que apenas geolocaliza os animais em momentos específicos, permitindo que produtores movimentem o gado para áreas legalizadas, o governo ressalta que a ferramenta vai evoluir gradativamente.
“O que quer que seja que você vá controlar, você não consegue pegar tudo”, diz Raul Protázio Romão, secretário de meio ambiente e sustentabilidade do Pará. “Você tem que progressivamente implementar mecanismos de controle que evoluam constantemente e que vão fechando gaps”.
LEIA MAIS: