A Amazônia vive hoje uma situação alarmante: 46% (171 de 371) das barragens de mineração apresentam problemas estruturais ou alto risco de rompimento, podendo atingir 590 km² na Amazônia, — o equivalente a mais que o dobro da cidade de Porto Alegre (RS). Seis estados da Amazônia seriam afetados em caso de acidente: Pará, Maranhão, Mato Grosso, Amapá, Rondônia e Amazonas.
A situação mais crítica se concentra no Pará. No Estado, uma área de 409,48 km² – abrangendo cidades como Barcarena, Almeirim e Parauapebas, além 345 km² de floresta e comunidades quilombolas com mais de 400 famílias – está sob ameaça iminente de inundações por rejeitos., como lama, líquidos e resíduos tóxicos.
Baseada em dados da Agência Nacional de Mineração (ANM), a análise exclusiva da InfoAmazonia revela que nos outros estados, o impacto seria menor: em Mato Grosso, 64,99 km² seriam atingidos; Maranhão, 51 km²; Amapá, 24,58 km²; Rondônia, 21,94 km²; e Amazonas, 18,51 km².
No entanto, o histórico de rompimentos no Brasil mostra que os cálculos preditivos de área em caso de acidente não são precisos:
“As informações das barragens são enviadas pelas próprias empresas, não são produzidas pelo Estado. Isso prejudica a eficácia desses dados”, explica Francisco Kelvin da Silva, coordenador do Movimento dos Atingidos por Barragens, organização que atua no tema desde 1970.
Segundo Silva, oficialmente, o Brasil tem cerca de 30 mil barragens para diferentes usos: contenção de sedimentos, hidrelétricas, geração de energia, irrigação, navegação, espalhadas por todo o território nacional: “Entretanto, os pesquisadores indicam que o número pode ser ainda maior, especialmente em regiões do interior do país que ainda não estejam cadastradas pelo governo”.
Além disso, no caso das barragens de mineração, há um déficit nos registros, pois existem áreas não cadastradas, como aquelas que indicam a presença de garimpo ilegal. Foi esse o caso do rompimento ocorrido em fevereiro, no Amapá, quando os rios Cupixi e Araguari foram manchados com lama, areia e argila, resíduos da extração de ouro, nos municípios de Pedra Branca do Amapari e Porto Grande.
“No caso da Amazônia, uma quantidade muito grande de barragens ligadas à atividade do garimpo só está sendo identificada nos últimos relatórios, em virtude dos problemas de segurança que apresentam. Ou seja, são verificadas quando já estão causando algum dano”, diz Silva.
Despejo de minérios no Pará
A relação entre comunidades do Pará e grandes mineradoras é marcada por tensões. Um caso emblemático é o da norueguesa Hydro-Alunorte, que será julgada na Holanda por suposto despejo de minérios em rios de Barcarena e Abaetetuba.
A Associação Cainquiama denuncia que a poluição causou graves problemas de saúde nos moradores locais, algo que já havia resultado em uma condenação da Justiça Federal à empresa, com pagamento de R$ 100 milhões.
Lideranças como Maria do Socorro Costa Silva, da Cainquiama, e Sandra Amorim, de uma comunidade próxima a barragens da Imerys Rio Capim, expressam o sofrimento e a luta contra os impactos da mineração, incluindo a contaminação de rios.
Em Oriximiná, noroeste do Pará, quem sofre são os quilombos Boa Vista e Alto Trombetas, que ficam próximos de 11 barragens de mineração da empresa Mineração Rio do Norte (MRN), que explora bauxita na região do Vale do Trombetas.
Primeiro quilombo a receber titulação no Brasil, em 1995, o Boa Vista abriga 50 famílias. Mas a chegada da empresa antes da a ação do Estado, em 1979, alterou o território, inicialmente com a construção da vila de Porto Trombetas para seus funcionários, seguida por relatos de despejos e instalação de tubulações para descarte em lagos.
Apenas após a instituição da Política Nacional de Meio Ambiente, em 1981, que estabeleceu o licenciamento ambiental e planos de segurança, parte desses impactos começou a ser mitigada.
“A gente fica a 100 metros de uma barragem dessas. Mora gente ao lado da barragem e na frente dela. Então, não tem como dizer que lá não há risco. Você não sabe a hora nem o momento em que ela pode estourar, entendeu? Já são muitos anos jogando lama nos igarapés”, explica Munduca.