Uma refinaria do Texas que fornece combustível “verde” para companhias aéreas dos Estados Unidos tem comprado gordura animal de gado criado em terras desmatadas ilegalmente na Amazônia. A descoberta é de uma análise da agência de notícias Reuters, em parceria com a Repórter Brasil, que teve acesso a dados de rastreamento de gado e documentos.
É diante de escândalos como esse que a nova política de rastreabilidade individual de bovídeos do Pará se torna uma “vacina” contra o desmatamento ilegal. A iniciativa permite que empresas e produtores comprovem a legalidade de sua produção. Ao rastrear cada animal, do nascimento ao abate, o sistema promove a transparência na cadeia produtiva, o que aumenta a confiança do consumidor, valoriza a pecuária paraense e gera mais emprego e renda para os produtores.
A Diamond Green Diesel, uma joint venture entre a Darling Ingredients e a Valero Energy, investiu milhões de dólares em uma refinaria que transforma gordura bovina em uma alternativa mais limpa ao combustível de aviação. A empresa já arrecadou mais de US$ 3 bilhões em créditos fiscais desde 2022.
A investigação mostra que pelo menos duas empresas brasileiras que forneceram gordura bovina à Diamond Green Diesel estão comprando o material de frigoríficos que adquirem gado de fazendas com desmatamento ilegal na Amazônia. Uma delas é a paraense Araguaia, que obteve gordura bovina de pelo menos cinco frigoríficos reprovados em uma auditoria do Ministério Público Federal por abaterem gado de áreas desmatadas ilegalmente.
A conexão com o desmatamento
A investigação descobriu que a unidade paraense Araguaia exportou US$ 4,4 milhões em sebo bovino da Amazônia para a Diamond Green Diesel em 2023. A investigação aponta que o frigorífico São Francisco, um dos fornecedores da Araguaia, comprou gado indiretamente da fazenda Vale do Paraíso, que estava embargada pelo Ibama por desmatamento ilegal. Embora a fazenda tenha sido desbloqueada por decisão judicial, seu proprietário, Antonio Lucena Barros, ainda deve R$ 19 milhões em multas.
Outra planta da Darling Ingredients obteve gordura de um matadouro que comprou centenas de cabeças de gado de Bruno Heller, descrito pela Polícia Federal como “o maior desmatador da Amazônia” em uma investigação de 2023.
Especialistas alertam que a crescente demanda por esse tipo de combustível pode impulsionar o desmatamento, e a prática pode violar a legislação brasileira. O procurador Ricardo Negrini, do MPF, afirmou que “empresas que têm lucro com matérias-primas oriundas de uma cadeia produtiva que passa por ilegalidades, por desmatamento, elas se responsabilizam também por essas ilegalidades”.
A Investigação e a falta de resposta
A investigação analisou documentos judiciais, registros corporativos e dados de rastreamento de gado. A agência também entrevistou mais de uma dezena de pessoas envolvidas na cadeia de produção.
A Reuters tentou, sem sucesso, obter um posicionamento das empresas Diamond Green Diesel, Darling Ingredients, Valero Energy, Southwest e JetBlue. A reportagem ressalta que a Diamond Green Diesel obtém sebo de diversos países e não foi possível determinar a quantidade exata que veio de fazendas em terras desmatadas ilegalmente na Amazônia.
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