A seca extrema que atingiu a Amazônia em 2024 alterou profundamente a rotina escolar de milhares de crianças e adolescentes. Segundo levantamento do Unicef, 436 mil estudantes enfrentaram interrupções nas aulas, falta de água e dificuldades de acesso a serviços básicos, consequência direta da queda recorde no nível dos rios.
Santarém, no oeste do Pará, concentrou parte das comunidades mais impactadas, chegando a receber a Declaração de Situação de Recursos Hídricos, no trecho baixo do rio Tapajós. Lá, as secas interferiram diretamente no transporte escolar e na alimentação de quem vive nas comunidades, gerando isolamento.
Professores, como Lucas Souza, precisaram ajustar as técnicas de trabalho diariamente entre outubro de 2024 e janeiro de 2025: atividades impressas, já que nem todos conseguiram acompanhar por celular, aulas remotas e até flexibilidade nos de calendários escolares.
“Mesmo nos empenhando, não dá para negar que houve prejuízo. Imprimimos as atividades para as crianças menores e acompanhávamos as equipes que entregavam as cestas básicas para deixar as atividades da semana. Sempre que algum grupo de saúde ou assistência ia até essas comunidades, nós acompanhávamos. Digo que houve prejuízo porque, além do esforço diário no acesso à educação, algumas estavam passando fome também, porque o rio secou”, relata.
O relato de Lucas também reforça outro ponto abordado no estudo: o agravamento de vulnerabilidades que vão da alta de água potável, prejuízos à agricultura e temperaturas cada vez mais altas, gerando doenças respiratórias, dores de cabeça e queda na concentração.
Para o Unicef, os efeitos mais severos foram observados em comunidades ribeirinhas, indígenas, quilombolas e tradicionais, que dependem diretamente dos rios para acessar a escola. A crise climática, reforçada por queimadas e mudanças nos padrões de chuva, criou um ciclo de prejuízos que ultrapassa a educação e afeta direitos básicos dessas populações.
Em todo o Brasil, os eventos climáticos fizeram 1,17 milhão de estudantes perderem dias letivos em 2024 – o dobro da média do ano anterior. No mundo, mais de 242 milhões de crianças tiveram aulas interrompidas por secas, enchentes e ondas de calor.
Na COP30, encerrada no último sábado (22), crianças e adolescentes de diferentes regiões apresentaram uma carta denunciando o cotidiano de calor extremo e deslocamentos cada vez mais difíceis. Embora os efeitos da crise climática na educação ainda tenham pouco destaque nas negociações globais, a COP de Belém trouxe fôlego e relatos de sobreviventes, que pedem a urgência da inclusão da pauta nas estratégias de adaptação climática.


