A temperatura média na Amazônia brasileira em 2024 foi de um grau e meio (1,5° C) acima da média histórica, uma marca que, idealmente, não deveria ter sido atingida, conforme o Acordo de Paris. Não foi um caso isolado: o Pantanal também superou a marca, registrando um aumento de 1,8° C em relação à média no ano passado.
Estes são alguns dos dados inéditos que o MapBiomas lança nesta quarta-feira (5), às vésperas da COP30, por meio de sua nova plataforma, o MapBiomas Atmosfera. A ferramenta utiliza imagens de satélite e modelagem de dados para disponibilizar dados climáticos sobre variações de temperatura e precipitação entre 1985 e 2024, além de informações sobre poluentes atmosféricos entre 2003 e 2024, cobrindo todo o território brasileiro.
“O MapBiomas Atmosfera é uma nova ferramenta que auxilia o Brasil a implementar políticas públicas baseadas em evidências experimentais e mostra quais seriam as regiões mais impactadas pelas mudanças do clima e mudança de uso da terra. É uma nova ferramenta importante para auxiliar na preservação de nossos ecossistemas”, destaca Paulo Artaxo, professor da USP e membro da iniciativa do MapBiomas Atmosfera.
De acordo com o coordenador-geral do MapBiomas, Tasso Azevedo, a Amazônia perdeu 52 milhões de hectares (−13%) de vegetação nativa desde 1985. No mesmo período, o bioma teve um aumento médio de temperatura de 1,2° C.
“Os estudos mais recentes apontam que a perda de florestas modifica as trocas de calor e de vapor d’água com a atmosfera, resultando em temperaturas mais elevadas,” acrescenta.
Um desses estudos, publicado na Nature Geoscience, mostrou que o desmatamento causa 74% da redução das chuvas e 16% do aumento da temperatura na Amazônia durante a seca.
Nas quatro décadas entre 1985 e 2024, a temperatura tem aumentado em todo o Brasil a uma taxa média de 0,29° C por década. É o caso do Pantanal (+0,47° C / década) e do Cerrado (+0,31°C / década) – ambos na parte mais continental do país. A Amazônia, como um todo, permaneceu na média ( 0,29°C / década), enquanto outros biomas costeiros apresentaram um ritmo mais brando de aquecimento: Caatinga (+0,25°C / década), Mata Atlântica (+0,21°C / década) e Pampa (+0,14°C / década).
“Os últimos três relatórios do IPCC já apontavam estas tendências de aquecimento e de alteração da precipitação que estamos observando na plataforma MapBiomas Atmosfera,” afirma Paulo Artaxo. “Estes aumentos de temperatura têm impactos significativos em todos os biomas brasileiros. A redução de precipitação também tem efeitos importantes, especialmente na Amazônia e no Pantanal”, complementa.
Anomalias de temperatura e seca
Desde 2014, a temperatura no Brasil se mantém acima da média (1985-2024). O maior valor de anomalia foi em 2024, quando a temperatura ficou 1,2°C acima da média dos últimos 40 anos. O Pantanal registrou o recorde de anomalia em 2024, com temperaturas 1,8°C acima da média. A seca no Pantanal foi extrema: a Bacia do Alto Paraguai registrou precipitação 314 mm abaixo da média, com 205 dias sem chuva.
De acordo com o MapBiomas Atmosfera, a temperatura do ar está aumentando em todo o Brasil, mas com variações de estado a estado. Nas unidades federativas mais continentais, como Mato Grosso do Sul, Mato Grosso e Piauí, a temperatura está subindo mais rapidamente, com taxas entre 0,34° C e 0,40° C por década.
Já os estados ao longo da costa brasileira tendem a apresentar menores taxas de aumento de temperatura, como Rio Grande do Norte, Alagoas e Paraíba (0,10° C a 0,12° C/década).
Poluição do ar e impactos na saúde
A nova plataforma MapBiomas Atmosfera inclui ainda dados sobre poluição do ar entre 2003 e 2024, estimados a partir de modelos atmosféricos globais.
Eles mostram que o ar mais limpo do Brasil se encontra em estados litorâneos do Nordeste, como Bahia, Sergipe e Pernambuco, onde a concentração de material particulado fino (MP2,5) foi inferior a 7 µg/m³ em 2024.
“O material particulado fino (MP2,5) é composto por partículas microscópicas presentes no ar, que representam uma das formas mais nocivas de poluição atmosférica e oferecem riscos à saúde da população,” explica Luiz Augusto Toledo Machado, professor visitante da USP e membro da equipe MapBiomas Atmosfera.
Em Rondônia e Mato Grosso, os estados que apresentaram as maiores concentrações de material particulado fino do Brasil em 2024, a média anual de MP2,5 foi estimada em 42 e 30 µg/m³, respectivamente.
“De forma geral, a poluição do ar na região Norte foi mais intensa do que em áreas fortemente urbanizadas da região Sudeste em 2024. A baixa qualidade do ar em estados amazônicos tem relação direta com a fumaça dos incêndios florestais, que ocorrem principalmente na estação seca do bioma, entre julho e setembro, quando as chuvas diminuem de 250 mm/mês para 100 mm/mês, aproximadamente”, esclarece Luciana Rizzo, professora da USP e integrante da iniciativa do MapBiomas Atmosfera.
Menos chuva, mais fogo
No pico da estação do fogo, em setembro, a área queimada na Amazônia atinge dois milhões de hectares, em média. A concentração média de MP2,5 pode chegar a 43 µg/m³ nessa época do ano. Por outro lado, na época das chuvas, as concentrações de MP2,5 ficam abaixo de 15 µg/m³ na Amazônia.
Enquanto a temperatura do ar tem aumentado sistematicamente em todo o país, a precipitação anual mostra um comportamento mais complexo, com alternância entre períodos secos e chuvosos nos últimos 40 anos em todo o Brasil. Em 2009 choveu 252 mm (+14%) acima da média no país. Já 2023 foi o ano mais seco, com chuvas 308 mm (-18%) abaixo da média, quando se registrou o volume de 1446 mm.
O padrão de seca no Norte e chuvas no Sul é tipicamente observado em anos de El Niño. Em 2024, a Amazônia registrou chuvas 448 mm (-20%) abaixo da média, enquanto a temperatura ficou 1,5° C acima da média. A diminuição das chuvas contribuiu para o aumento da área queimada, que atingiu 15,6 milhões de hectares no bioma em 2024.


