Por Tereza Coelho
Para enfrentar a crise climática, um jovem de uma comunidade quilombola em Portel, na região do Marajó, criou um projeto que inclui a criação de um banco de sementes para preservar espécies centenárias na região. Atualmente, o Brasil possui o maior banco de sementes da América Latina com mais de 120 mil amostras, incluindo espécies alimentares e forrageiras (plantas utilizadas para proteger o solo e alimentar o gado).
Maicon Oliveira, professor e especialista em educação no campo, é um dos filhos do quilombo São Sebastião Cipoal e um dos participantes da Juventude Pelo Clima, iniciativa do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), que incentiva o retorno de estudantes universitários de origem indígena, quilombola e extrativista para seus territórios com a missão de liderar projetos de enfrentamento à crise climática e preservação do bioma.
O projeto de Maicon possui 32 metas em várias frentes de atuação, algumas delas já em execução anterior ao projeto graças à atenção da comunidade com o tema.
“Já adotamos práticas como a redução do uso do fogo, identificação de áreas com risco ou presença de erosão, fortalecimento de práticas sustentáveis no uso do solo, cultivo de culturas da agricultura familiar”, conta.
Desta forma, o projeto é uma consolidação dos esforços da comunidade em atuar contra a crise climática, proporcionando a oportunidade de atrair investimentos e chamar a atenção de empresas ou instituições para apoiarem quem luta diariamente pela preservação da floresta.

Garantia de vida
Os bancos de sementes servem como um ‘cofre’ para preservar a diversidade genética local e garantir o acesso a sementes de boa qualidade em casos extremos que ponham em risco a cultura agrícola de uma região.
En nível nacional, o Brasil possui o Banco Genético da Embrapa (Cenargen), o maior da América Latina, que preserva mais de 120 mil sementes e é parceiro do Banco Mundial de Sementes (Svalbard Global Seed Vault), conhecido como ‘Cofre do Apocalipse’, que preserva mais de 1,4 milhão de sementes de boa parte dos países do mundo em uma ilha remota na Noruega banhada pelo Oceano Glacial Ártico.
O projeto da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO) em criar o ‘cofre’ é preservar sementes de plantas importantes para a humanidade, especialmente espécies vitais para a alimentação global em um local livre de catástrofes naturais, guerras, mudanças políticas ou interferências relacionadas à má gestão.
Preservando a ancestralidade
Maicon narra que o banco de sementes serve tanto para evitar a perda de espécies medicinais como para ofertar alimentos para a escola local futuramente. Ele conta ainda que os ventos fortes e a seca extrema que atingem a região ano a ano estão matando as árvores centenárias, ervas e plantas medicinais. Logo, permitir que as mais de 80 famílias da região possam ter sua farmácia no quintal é uma forma de preservar os saberes ancestrais, conta.
“Queremos (utilizar o banco de sementes) para reflorestar áreas desmatadas no território ou áreas com características desérticas, que já mapeamos bem antes deste projeto. Transformar essas áreas em um grande viveiro”, diz.
Em breve, o projeto abrirá para a captação de recursos, que permitirá que outras iniciativas apoiem a expansão do projeto, mas desde já, Maicon celebra as fases em andamento e seu papel de preservação no ecossistema, na cultura ancestral e na história do quilombo de São Sebastião Cipoal.
“Ser quilombola e estar à frente dessa luta significa enfrentar o abandono histórico com coragem e construir soluções com base no conhecimento tradicional. Também é exigir que as políticas públicas finalmente olhem para nós com o respeito que merecemos. É saber que cada passo, cada reunião, cada debate está diretamente ligado ao futuro das nossas crianças, à proteção da natureza que nos sustenta e à afirmação da nossa identidade. Eu não estou nessa caminhada sozinho. Levo comigo a força do meu povo, dos meus ancestrais e de toda uma comunidade que resiste e sonha com um futuro digno”, destaca.