Uma pesquisa feita por cientistas brasileiros está ajudando a entender melhor como reflorestar a Amazônia de forma mais eficiente. Um estudo recente publicado na revista científica internacional Forests traz contribuições importantes para quem trabalha com restauração florestal na Amazônia. A pesquisa, liderada pela pesquisadora Lucieta Martorano, da Embrapa Amazônia Oriental, apresenta uma ferramenta inovadora chamada zoneamento topoclimático, que ajuda a identificar quais espécies nativas são mais indicadas para cada região da floresta.
O método permite mapear o território e orientar o reflorestamento com base em dados climáticos e de relevo, promovendo o uso de 12 espécies amazônicas com alto valor ecológico e econômico. A ideia é tornar o reflorestamento mais eficiente, tanto do ponto de vista ambiental quanto social.
A pesquisa foi desenvolvida por especialistas da Embrapa, da Universidade Federal do Ceará (UFC) e de outras instituições parceiras. Segundo os autores, usar espécies nativas da Amazônia na recuperação de áreas degradadas ajuda a enfrentar as mudanças climáticas, além de gerar renda, recuperar a biodiversidade e tornar o ambiente mais resistente a eventos como secas e enchentes.
Os resultados da pesquisa também estão alinhados com a Lei de Pagamento por Serviços Ambientais, que permite recompensar produtores e comunidades que ajudam a conservar a natureza. A ideia é unir preservação ambiental com geração de renda e fortalecimento da bioeconomia amazônica. Com base na ciência, os pesquisadores mostram que é possível reflorestar de forma inteligente, respeitando o jeito de cada região e beneficiando quem vive e cuida da floresta.
A metodologia de zoneamento topoclimático foi criada para identificar as espécies de árvores nativas mais adequadas a cada tipo de solo, clima e relevo e pode ser aplicada a todos os biomas, não só à Amazônia.
A pesquisa cruzou mais de 7,6 mil registros georreferenciados de espécies como angelim-vermelho, ipê-amarelo, copaíba e mogno-brasileiro com dados climáticos e geográficos coletados entre 1961 e 2022. Com essas informações, os cientistas criaram mapas que mostram se uma área é altamente, moderadamente ou pouco adequada ao plantio e manejo de cada árvore.
“É uma metodologia de planejamento com enorme potencial para embasar políticas públicas voltadas à restauração florestal, bioeconomia e adaptação climática. É ciência aplicada diretamente ao território”, explica a pesquisadora Lucieta Martorano, responsável pelo estudo.
Entre os resultados, o angelim-vermelho (Dinizia excelsa) se destacou por apresentar alta aptidão topoclimática em até 81% das áreas degradadas analisadas, o que mostra grande potencial para projetos de reflorestamento produtivo. Já espécies como o marupá (Simarouba amara), por serem mais resistentes a diferentes condições ambientais, podem ser usadas como “coringas” em locais de menor adequação climática, desde que acompanhadas de um manejo adaptado.
Além da Amazônia, o zoneamento topoclimático pode ser uma ferramenta valiosa para a recuperação de florestas e o uso sustentável da vegetação nativa em outros biomas, como Cerrado, Caatinga e Mata Atlântica.
Metas internacionais
Mais do que indicar onde plantar árvores, a metodologia de zoneamento topoclimático tem o potencial de alinhar políticas públicas ambientais aos compromissos assumidos pelo país no Acordo de Paris. Entre eles estão o reflorestamento de milhões de hectares e a proteção da biodiversidade.
Ao indicar as melhores áreas para o plantio de espécies nativas, o zoneamento fortalece a chamada bioeconomia, integrando conservação da natureza com geração de renda. Segundo o estudo, essa estratégia pode impulsionar o uso sustentável de florestas, fortalecer comunidades locais e ajudar o Brasil a avançar no combate às mudanças climáticas. A partir do zoneamento, governos e produtores rurais podem planejar projetos de reflorestamento com maior eficiência, o que também atrai financiadores e investidores interessados em soluções verdes, como práticas agroflorestais e sistemas sustentáveis de produção.
A metodologia pode ainda servir de base para programas de recuperação de áreas degradadas e para o fortalecimento do mercado de créditos de carbono, setor que cresce no Brasil. Somada a outros tipos de zoneamento já existentes, essa ferramenta contribui para conservar a biodiversidade e promover um desenvolvimento sustentável com resiliência ecológica.
“Quando o país identifica com precisão onde e como reflorestar, cria melhores condições para atrair investimentos climáticos internacionais”, ressalta pesquisador e coautor do artigo, Silvio Brienza Junior.
Ciência nacional na COP30
A realização da COP30, em novembro deste ano, em Belém (PA), coloca o Brasil no centro das discussões globais sobre o clima e reforça a importância da ciência nacional na busca por soluções baseadas na natureza. Um exemplo disso é a metodologia de zoneamento topoclimático, destacada como uma ferramenta estratégica para orientar ações de reflorestamento e conservação na Amazônia.
A pesquisa mostra que o modelo pode ajudar o Brasil a alcançar metas de neutralidade de carbono e a direcionar recursos de programas ambientais internacionais, como os chamados “fundos verdes”.
Para os autores, a metodologia fortalece a imagem da Amazônia não apenas como um bioma em risco, mas também como fonte de soluções climáticas inovadoras, baseadas na inteligência do território. O avanço de ferramentas como essa representa uma oportunidade para o Brasil liderar, com base científica, a construção de um futuro mais sustentável e justo, dentro e fora da floresta.
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